Comum ouvir pelo Brasil a expressão de que o futuro do nosso País são as crianças. Esse termo, um tanto corriqueiro, vem sendo questionado por alguns estudiosos, considerando que as crianças só poderão oferecer um futuro promissor se estiverem bem preparadas intelectualmente. Isto é, as escolas, a educação, são o suporte fundamental para que a expressão saia da boca dos brasileiros e faça parte efetivamente de suas vidas. Assim, um bom desempenho acadêmico torna-se crucial.
Para compreender o desempenho das crianças brasileiras no ambiente escolar, a professora Ana Lúcia Kassouf, do departamento de Economia, Administração e Sociologia, da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (USP/ESALQ), e seus alunos do programa de doutorado em Economia Aplicada Marcos Garcias, Ida Bojicic Ono e Camila Rossi, integraram ao projeto PEP (Partnership for Economic Policy), com o objetivo de analisar o desenvolvimento de crianças do 5º e 9º anos de escolas públicas, por meio de testes de aproveitamento escolar da “Prova Brasil”. No entanto, além de analisar o desempenho, a proposta é verificar como o trabalho infantil, dentro do domicílio ou no mercado, afeta a vida acadêmica dessas crianças.
“Controlamos as características das crianças, dos pais, dos professores e dos diretores, além da infraestrutura da escola e observamos que o trabalho infantil é maléfico e provoca reduções no desempenho escolar das crianças”, disse Ana Lúcia Kassouf, professora da ESALQ.
Os alunos do 5º ano, que conciliam trabalho e estudo, de acordo com a professora, são os mais prejudicados. As meninas que trabalham apenas no mercado, sofreram uma queda de 10% nos testes de Português e aquelas, que além do trabalho fora de casa, realizam serviços domésticos, também apresentaram uma redução de desempenho significativa. Já os meninos, que exercem funções tanto fora, quanto dentro de casa, tiveram redução de 8,3% em Português, disciplina em que os alunos demostraram maior dificuldade.
“Na análise, monitorando diversos fatores relacionados às crianças, família e escola, ainda notamos que as crianças que trabalham, seja no domicílio ou no mercado, apresentam menor rendimento escolar, pois estão mais cansadas e sobrecarregadas”, ressaltou a professora.
Já os alunos do 9º ano, de acordo com a professora, sofreram uma queda no desempenho, porém não tão alta. Aqueles que trabalham em casa apresentaram 2,4% de redução de desempenho nos testes de Matemática. Entre as meninas do 9º ano, 23% delas trabalham cerca de 3 horas por dia em atividades domésticas, em comparação com 9% dos meninos. No entanto, enquanto 21,5% dos meninos trabalham no mercado, menos de 10% das meninas exercem funções fora de casa. “Apesar das diferenças entre os meninos e as meninas, ambos são prejudicados no desempenho acadêmico por conta de atividades fora da escola”, disse a professora.
Contrariamente à visão da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que acredita nas tarefas domésticas realizadas por crianças em suas próprias casas, em condições razoáveis e sob supervisão de pessoas próximas a elas como uma forma de integrar a vida familiar, que favorecerá o crescimento, a professora e seus alunos afirmam que os resultados analisados mostram que o trabalho infantil, dentro ou fora de casa, atrapalha e diminui o desempenho das crianças na escola. “Nossas conclusões indicam que o trabalho doméstico, que muitas vezes não é contabilizado nas estatísticas sociais e não é considerado perigoso, deve ser incluído nas políticas de governo destinadas a combater o trabalho infantil”, ressaltou Ana.
Como sugestão, a professora aponta que se a carga horária nas escolas fosse estendida, essa poderia ser uma política para reduzir a quantidade de tempo que as crianças passam executando atividades fora do ambiente escolar. “Medidas de combate ao trabalho infantil deverão ser propostas por aqueles que estão inseridos na política, seja por meio de programas sociais, aplicação das inspeções de direito do trabalho ou aumentando, de alguma forma, a consciência sobre a importância da educação e o risco sobre a entrada precoce no mercado de trabalho”, finalizou Ana Lúcia Kassouf.
Texto: Ana Carolina Brunelli
Revisão: Alicia Nascimento Aguiar (08/08/2016)