Janeiro de 2014 ficou marcado, em Piracicaba, como o começo de ano mais quente desde 1917, com média mensal acima de 33ºC. Esse e outros índices chamam a atenção de parte da comunidade científica na busca por alternativas que amenizem o desconforto térmico.
Um estudo desenvolvido na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (USP/ESALQ) aponta a a quantidade de árvores necessária para diminuir o calor excessivo em determinada área urbana. Segundo a pesquisa, em Piracicaba, para diminuir 1°C na temperatura média urbana é necessário acrescentar 14,31% de cobertura arbórea na estação seca e 27,70% na estação chuvosa.
A pesquisa tem autoria do gestor ambiental Gustavo Torquato Oliva, com orientação do professor Demóstenes Ferreira da Silva Filho, do Departamento de Ciências Florestais e avalia a relação do conforto humano com métricas de cobertura arbórea. “A influência benéfica de áreas verdes no conforto humano em áreas urbanas tem sido reconhecida por estudos de diferentes campos do conhecimento”, aponta Oliva.
Para chegar ao resultado final, foram dispostos 43 registradores higrotérmicos microprocessados dentro de estabelecimentos residenciais (quintais), durante 40 dias de coleta tanto na estação chuvosa e seca dos anos de 2015 e 2016, além de uma estação meteorológica móvel, de modo a obter as variáveis de conforto humano relacionadas com a sensação térmica relatada pelos residentes. “A escolha dos 43 pontos priorizou estabelecimentos cuja área externa fosse propícia à instalação dos registradores de temperatura e umidade relativa, sendo que esses locais não poderiam ter a influência direta de parede e de outros materiais, além de serem em locais totalmente abertos”, explica Oliva.
Para o orientador do projeto, a população brasileira é essencialmente urbana e carece de melhor qualidade no que diz respeito ao conforto nos espaços abertos públicos e privados, principalmente nos médios e grandes centros urbanos. “Neste sentido as árvores e o restante de verde urbano exercem influência positiva e decisiva para condicionar um microclima mais adequado e proteger residências dos diversos efeitos negativos existentes nas áreas urbanas como a poluição e as ilhas de calor. Além disso, as árvores amenizam a diferença entre a escala humana e outros componentes arquitetônicos como altos prédios, muros e grandes avenidas”, relata o professor Demóstenes.
Segundo o autor do trabalho, atualmente não existe resposta para a quantidade de árvores necessária para diminuir o calor excessivo em determinada área urbana. “Isso é algo bastante desejável em tempos de alterações climáticas e com cidades em crise de abastecimento de água e energia elétrica. Um modelo climático a partir de dados fornecidos por sistema de informações geográficas na escala das árvores e das pessoas seria importante como ferramenta de baixo custo para justificar mudanças nos tecidos urbanos de nossas cidades com intuito de melhorar o ambiente urbano”.
A pesquisa correlacionou os dados de temperatura do ar e umidade relativa com a porcentagem dos materiais de cobertura do solo obtidos por classificação do tecido urbano de Piracicaba. Dos 43 pontos observados, foram selecionados 4 que apresentam diferenças com relação ao uso e ocupação do solo urbano a fim de se inferir o conforto entre essas áreas. Assim os resultados foram refinados com dados de registros realizados na região central e nos bairros Vila Fátima (região Norte), Campestre (região Sul) e São Jorge (região Oeste).
Floresta urbana – Foram obtidos os valores do Índice de Floresta Urbana (IFU) para os bairros estudados. “Constatamos que a Vila Fátima e Campestre foram os que apresentaram maiores IFUs se comparados com a Cidade Alta e o São Jorge, corroborando, por assim dizer, no maior conforto dessas áreas e indicando o IFU como um índice que tem uma grande representatividade da realidade local de estudo, pois melhor representa as classes de cobertura do solo por abrangê-las totalmente”. Como consequência, o estudo comprova que, durante o dia, a Cidade Alta e São Jorge apresentaram maiores valores de temperatura e menores valores de umidade relativa, em contrapartida, a Vila Fátima e o Campestre foram os bairros que apresentaram menores valores de temperatura e maiores valores de umidade relativa para ambas as estações.
Sensação térmica – Além dos registros eletrônicos, os pesquisadores da ESALQ entrevistaram moradores nos quatro bairros foco do estudo. Durante a estação chuvosa, os entrevistados dos bairros São Jorge e Cidade Alta em nenhum momento relataram conforto mesmo em condições de sombra, sendo que no bairro São Jorge 75% das respostas foi de o clima naquele momento estar “Muito Quente”. Na estação seca, que coincide com o inverno, embora os entrevistados tenham relatado sensação de conforto, a Cidade Alta e o São Jorge foram os únicos bairros que apresentaram condições térmicas “Muito Quente”. “Outro fato curioso é que o Bairro São Jorge foi o único também no qual os entrevistados relataram condições de “Muito Frio” nas primeiras horas do dia, já que a ausência de vegetação explica a maior incidência de ventos, o que faz com que a sensação térmica seja mais intensa do que em áreas vegetadas”, complementa Oliva.
Portanto, de maneira geral, tanto na estação chuvosa quanto seca, constata-se que a Vila Fátima e Campestre são os bairros que representaram menores temperaturas superficiais do solo, confirmando que essas áreas são mais confortáveis termicamente se comparadas com Cidade Alta e São Jorge.
As informações reveladas por este levantamento podem agora serem utilizadas como métodos de avaliação do conforto térmico, dando como resposta a quantidade de árvores necessária para diminuir a média de temperatura na área urbana. “Isso deverá auxiliar profissionais no planejamento e readequação das cidades diante aos problemas ambientais, a fim de proporcionar maior conforto ambiental urbano para a população e inspecionar e avaliar a situação da arborização urbana nas cidades brasileiras”, finaliza o pesquisador.
Texto: Caio Albuquerque (17/05/2017)